quarta-feira, 19 de março de 2014

"Primeiro eles o ignoram, depois riem de você. Em seguida lutam com você, e então você ganha" - Resenha do livro "Perdão Leonard Peacock" - Mattew Quick

Os heróis e vilões das histórias populares raramente são o que parecem ser. Cruzado de um homem é o assassino de outro homem.

Nunca é fácil julgar uma pessoa, mesmo com todos os fatos expressamente aparentes. E ainda assim, os pseudo culpados ficam a mercê do julgamento final. Mas a história raramente faz as coisas direito. Embora a ciência da história é toda sobre fatos, a concepção moderna da história raramente é precisa. A percepção de eventos passados é tão manchada por séculos de propaganda antiga que pode ser difícil de discernir a verdade da nossa sociedade própria, como se fossem interpretações coloridas.

Olhe ao seu redor nesse momento, procure por noticias na internet, em seu tablet, jornal ou revista impressos. O mundo está cercado de coisas ruins, males diários que passam por nós sem que, muitas vezes, possamos sequer notar. Não é o caso do protagonista do livro de Mattew Quick. Leonard Peacock se importa. Sua luta diária é não deixar o mundo destruí-lo, mais do que possivelmente já o estilhaçou por dentro.

A narrativa desta obra se passa praticamente em torno de um único dia, o aniversário de 18 anos de Leonard, e também o dia em que ele escolheu para matar seu ex melhor amigo e depois se suicidar com uma P-38 nazista- "Mato você mais tarde - digo para o sujeito no espelho, e ele apenas sorri de volta, como se mal pudesse esperar" (uma das frases mais chocantes que li apenas no primeiro capítulo do livro).

Além de carregar a arma que foi de seu avô, Leonard também embrulha quatro presentes com papel cor de rosa para entregar as pessoas mais importantes de sua vida, antes de completar sua missão. É por isso que as pessoas dão presentes, certo? Por que não sabem como se expressar em palavras, então dão presentes para expressar simbolicamente seus sentimentos.

Leonard pretende se despedir de quatro pessoas: Walt, seu vizinho idoso e solitário com quem passa o tempo assistindo filmes de Humphrey Bogart; Baback, um garoto de sua escola e talentoso violinista, mas que não quer ser seu amigo por o achar um tanto quanto estranho; Lauren, uma jovem cristã que ele conheceu no metrô, e que tenta a qualquer custo o converter para conhecer o amor de Jesus Cristo, e por fim, Herr Silverman, um educado e muito competente professor, que ensina aos seus alunos sobre Holocausto, promovendo debates e reflexões dignos de te prender por horas, talvez dias a fio no assunto.

Em todas as visitas para a entrega dos presentes, percebemos que Leonard tenta de uma forma quase suplicante que aquelas pessoas o tirem do abismo que ele se encontra, e que o salve de sua missão, mas nenhuma delas consegue enxergar a profundidade de sentimentos que habita o jovem, até então, pré julgado como "esquisito". Admito que até certo ponto do livro eu mesma cheguei a pensar que ele tinha problemas freudianos em relação ao papel de seus pais em sua vida, e seria mais um adolescente clássico de estórias trágicas modernas que sai atirando em seus amigos e depois se mata.

A mágica do livro é que somos levados a julgar até nosso limite (lembrem se dos fatos expressamente aparentes), para depois ganhar de brinde um grandíssimo tapa na cara, revelando a verdadeira mensagem deste livro.

Os capítulos são quebrados por algumas "cartas do futuro". Nelas existem mensagens reconfortantes de como seria o futuro de Leonard, pedidos de força e superação, que são escritas pelo próprio protagonista, a fim dele tentar enxergar algum motivo para não se matar. A parte realmente emocionante do livro são as tais cartas, que apresentam um cenário otimista, e pessoas que realmente entendem a essência de Leonard, e pedem para que ele não acabe com sua vida. Neste momento, entendemos o que de fato aconteceu.

Leonard foi abusado sexualmente por anos a fio pelo seu melhor amigo, Asher. Sua mãe é uma mulher completamente ausente, que chegou a pegar os dois nus em seu quarto e nada fez a respeito, seu pai, um ex viciado em drogas e também alcoólatra, está perdido no mundo, e Leonard não têm ninguém a não ser a sua própria consciência.

Perdão Leonard Peacock, traz a tona problemas sociais muito comuns nos dias de hoje, porém repassáveis aos nossos olhos frustrados com nossas vidas entediantes e nossas dividas intermináveis.

Como funciona a mente de um jovem que sofre buylling e possui pais relapsos? Como você imagina a luta interior de uma pessoa para viver dessa maneira? Leonard tenta a qualquer custo enxergar positividade antes de tomar uma decisão fatal. Ele se veste como um adulto todos os dias depois da escola e anda de metrô sem rumo analisando as pessoas, para tentar enxergar na escuridão alguma possibilidade de luz. E o que ele vê? Pessoas cabisbaixas, que só reclamam e xingam umas as outras porque estão bravas com seus chefes mandões, com seus maridos e esposas ausentes, com filhos barulhentos e a falta de sono. Leonard escreve em suas cartas do futuro uma vida simplória, onde o aniversário de seus filhos são lembrados todos os anos, onde um sorriso vale mais do que dinheiro e onde os seres humanos possam se olhar nos olhos sem nada a temer.

Sei como é difícil ser diferente. Mas também sei a arma poderosa que ser diferente pode vir a ser. Como o mundo precisa de tais armas. Gandhi era diferente. Todas as grandes pessoas também pessoas únicas, precisam procurar outras pessoas únicas que as entendam, para que não fiquem muito solitárias e salvem as pessoas normais delas mesmas.

Por fim, quando Leonard percebe que ele não pode mudar o mundo, mas que ele pode mudar a percepção da vida dentro de si mesmo, ele coloca em pratica aquilo que Antonie de Saint Exupéry já pregou uma vez em sua vida: "É bem mais difícil julgar a si mesmo que julgar os outros. Se consegues fazer um bom julgamento de ti, és um verdade sábio".

Um deleite de verdades, uma realidade injusta e cruel, um triste recomeço, porém uma leitura belíssima em essência e ensinamento de vida. Minha total e singela indicação de horas de reflexão sobre seus próprios julgamentos internos e externos. Você tem coragem de se enviar uma carta do futuro?

Minha nota: 10

terça-feira, 11 de março de 2014

Um livro por semana, dá?

Vivem me perguntando "Como você consegue ler tantos livros?"

Eu respondo "Não sei, apenas pego um livro na mão e não consigo mais parar de ler".

A leitura me curou em muitos sentidos, me faz viajar para bem longe sem ter que sair de casa, sorrir sozinha e até mesmo derrubar algumas lágrimas, afinal ninguém é de ferro. Mas para resumir, eu sou mai feliz porque toda semana tenho um livro diferente em minha cia.

O post abaixo dá algumas interessantes dicas para quem admira e gosta de uma boa leitura, mas acha humanamente impossível conseguir ler um livro por semana. Garanto, tem como concluir esta proeza, e ainda se sentir muito satisfeito com isso.

http://www.brasilpost.com.br/julien-smith/como-ler-muito_b_4941486.html

Divirta-se e boa leitura.

quinta-feira, 6 de março de 2014

"A palavra casa não é um lugar. É uma pessoa. E nós, finalmente, estamos em casa" - Resenha do livro "Anna e o Beijo Francês" - Stephanie Perkins

Por mais que eu tente, o meu lado Shakespeare de ser e sentir a vida, não me deixa nem mesmo nos momentos que penso que não posso mais ser uma menininha apaixonada por romances mamão com açúcar. Pois bem, eis que cai em minhas mãos uma história assim, que sem mais nem menos me fez pensar em Neruda e seu amor platônico incansável e inabalável: "Eu a amo como certas coisas obscuras são amadas, secretamente, entre a sombra e a alma".

Você já entendeu por esse inicio, que temos dois personagens centrais: um que ama solenemente e outro que ama secretamente. Sim, eles demoram o livro inteiro para enxergar que nosso amigo aspirante dos amores platônicos tinha toda razão do mundo ao poetizar que os amantes amam em silêncio, e perdem a grande chance de serem felizes porque amar dá medo, tomar decisões dá medo, respirar dá medo, mas como qualquer necessidade biológica, é um mal mais do que necessário.

Vamos aos protagonistas deste belo e simplista romance: Anna Oliphant, é uma menina de 17 anos, filha de um escritor famoso. Eles têm uma vida em Atlanta tipica de comercial de margarina. Anna têm uma melhor amiga, um emprego e um garoto que ela espera que seja seu futuro namorado. Sua modesta vida dá uma reviravolta quando seu pai resolve a mandar para Paris para terminar o ensino médio na SOAP (School of America in Paris). Como qualquer adolescente, Anna não se sente nada feliz em sair de sua zona de conforto e acredita que seus dias vão acabar da forma mais horrenda que existe, longe de tudo que para ela era considerado seu precioso e imaculado lar.

Seu primeiro dia de aula não foi dos piores, levando em conta que ela conhece ótimas pessoas, dispostas a serem seus amigos e lhe apoiar nessa brusca mudança de cultura e costumes. Dessa forma, Anna conhece Meredith, Rashimi, Josh e o lindo, popular e inteligente St. Clair. Tudo perfeito, tirando o fato de que o aspirante a arrancar suspiros por onda passa, namora há uma eternidade a precoce e perfeita Ellie, que já adentrou o mundo universitário bem antes de seus amigos. Se não bastasse, Meredith é secretamente apaixonada por St. Clair, e você já pode imaginar que assim se forma um torturante quadruplo amoroso.

Anna não sabe falar francês, e isso complica um pouco sua vida na capital do romance. Eis que o príncipe encantado, ops, St. Clair começa a se aproximar de Anna, ajudando a pedir comida, passear por Paris, e aos poucos se soltar e conseguir se virar sozinha. Logo, ela pega o jeito, e com o passar do tempo, ela e St. Clair se tornam melhores amigos, inseparáveis, daqueles que leem o pensamento um do outro apenas com um olhar.

Já em Atlanta, sua melhor amiga e Toph, (o garoto pelo qual Anna ansiou o ano todo para voltar a ver, afinal de contas, ele gostava dela e eles iam ser felizes para sempre), começam a namorar, e Anna percebe sutilmente que ali não era mais a sua cidade e que ela não se sentia mais em casa. Será possível que lar era uma pessoa e não um lugar?

No meio desta reflexão, Anna percebe que está perdidamente apaixonada por St. Clair, um menino que exala sensualidade, mas por outro lado, é um complicado e torturado ser humano. Sua mãe têm câncer terminal e seu pai é um homem egoísta e mulherengo. Como consequência, ele não consegue se ver sozinho, e sofre a distancia pela paixão por Anna e o medo o proibindo de terminar com Ellie e de dar esperanças a Meredith. Já que sua vida se resume a não saber qual passo dar para andar para frente, então melhor ficar parado no mesmo lugar, certo? Errado!

De novo eu cito Shakespeare: "Nossas dádivas são traidoras e nos fazem perder o bem que poderíamos conquistar, se não fosse o medo de tentar".

Como todo bom romance que se passa no cenário da belíssima Paris, a cidade dos eternos apaixonados, Anna e St. Clair têm seu momento derradeiro com direito ao beijo que sela por consequente a felicidade eterna do descobrimento da dominação do medo.

Não vi este romance como mais um clichê onde duas pessoas se apaixonam loucamente mas não podem ficar juntas, e depois de muito derramamento de lagrimas, ficam juntas no final para nos passar a ideia de que depois da tempestade existe o pote de ouro no fim do arco iris. Não, eu vi muito mais do que isso.

Vi o medo de amar e ser amada, vi escolhas esdruxulas para apaziguar uma solidão eterna e o cobrimento de uma faceta falsa. Vi o descobrimento do amor próprio, do renascer de uma maturidade, da força indescritível do amor, e da tranquilidade que uma descoberta pode fazer dentro de um ser humano repleto de qualidades e defeitos, cheio de emoções pervertidas e um coração cheio de pedregulhos colados com cola de terceiro calão.

Vi tanto Shakespeare na minha frente, que cito ele novamente: "Estas alegrias violentas, têm fins violentos, falecendo no triunfo, como fogo e pólvora, que num beijo se consomem".

Anna e o beijo Francês, este título carrega muito mais do que um história de amor de adolescentes. Se você for um eterno apaixonado por esse sentimento que de impecável não tem nada, você vai ver sua força em cada palavra, cada frase e em cada cena imaginativa de Anna e St. Clair  na bela e romântica Paris, definitivamente o meu lugar preferido no mundo. Pois foi ali que também iniciei uma jornada de fins violentos e o inicio de uma vida mais repleta de significados.

Para saber o que acontece com os outros elementos deste romance, recomendo ler, mais leia com o coração, se não ele não vai passar de uma passatempo sem sentido e muito simplista aos olhos de quem nunca sofreu por amor. Lembre-se, assim como a lição desta obra: se você não tentar, não vai sair do lugar. Que tal abrir a primeira página?

Minha nota: 9,5