É apenas na lógica que abrigam todas as respostas aos conflitos existenciais
do ser humano? A matemática e a lógica transcendem a existência racional, e dá
lugar há algo muito mais misterioso e sem a menor explicação, pelo menos até o
presente momento: o acaso. O velho ditado "Nada é por acaso" tem um
quê de romantismo, contudo, não é possível que esse mundo seja conduzido apenas
de acasos. As pessoas se acostumaram com o mundo como ele é, assim como aceitam
fatos incompreensíveis da vida como fatalismo, mas eu me nego a acreditar nisso.
Vejo o mundo de forma grandiosa, até mesmo a nossa natureza limitada, porém
livre, que nos força a superar nossos próprios limites, tanto como indivíduos,
como em coletividade. Torço para que essa mesma coletividade não demore muito
para compreender, finalmente, a grandeza da vida e a inteligência divina na
qual vivemos imersos.
Iniciei desta maneira para falar sobre um livro que abriga justamente o
mistério do acaso. “Deixe a neve cair” é um livro colaborativo, que reúne três
contos que se passam durante uma nevasca natalina, e de certa forma, se cruzam
em determinado momento formando uma única história. Não são simples histórias
fantásticas de acasos no período mais altruísta do ano, mas sim, histórias de
amor adolescente, recheados de misticismo e encontros interiores dignos de um
espetáculo de cinema.
A primeira história (O Expresso Jubileu) escrita por Maureen Johnson, fala
sobre Jubileu, uma adolescente de 16 anos portadora de um nome bem esquisito.
Na véspera de Natal, ela é obrigada a pegar um trem para a casa dos avós, na
Flórida. Obrigada porque seus pais cometeram um "pequeno" deslize
natalino e foram parar atrás das grades. Claro que sua viagem não seria tão
emocionante se o trem não atolasse no meio de uma nevasca, e ela se encontrasse
cercada por um bando de cheerleaders insuportáveis e longe de seu namorado
perfeito, que comemoraria com ela um ano de namoro no dia do Natal. Drama
concluído, Jubileu em um momento de fúria extremada, resolve sair do trem e
caminhar na neve até uma Waffle House, e é lá que conhece seu acaso: Stuart. Um
simpático rapaz que muda literalmente seu caminho, e a faz refletir sobre
aceitação. Quem nunca se contentou com migalhas? Jubileu namora um rapaz
egoísta, que só possui tempo para si próprio, e sua importância em relação à
namorada é nota dez negativo. Aqui vai minha primeira pergunta: Todo este drama
precisava acontecer desta maneira para que Jubileu aceitasse sua condição, e
tivesse a possibilidade de mudar sua história através de uma nova chance para
si própria? Qual expressão matemática caberia neste caso? Subtração, certo?
Tirar um para obter um melhor resultado no final.
O segundo conto escrito pelo aclamado John Green (O Milagre da Torcida de
Natal), apresenta três personagens: Tobin, JP e Duke (a única menina do pequeno
grupo). O trio de amigos está disposto a tudo por um pouco de diversão, afinal
de contas, quem gosta de passar a véspera de Natal preso em casa por causa de
uma nevasca assistindo a toda coleção de DVDS do James Bond? A emoção começa
quando Tobin recebe uma ligação de seu amigo Keun, coordenador da Waffle House,
alertando os amigos de que a nevasca paralisou um trem a caminho da Flórida, e
a lanchonete está repleta de cheerleaders. Tobin e JP logo se animam e carregam
Duke, que apesar de achar tudo uma babaquice adolescente, só consegue pensar
nas batatas rosti que vai comer ao chegar à Waffle House. O conto basicamente
fala sobre a saga do trio para chegar à lanchonete, dirigindo e caminhando no
meio da neve pesada, enquanto tentam sobreviver aos outros valentões que têm o
mesmo objetivo dos garotos. No meio desta aventura, o acaso chega de forma
tímida para Tobin e Duke, que descobrem um sentimento mútuo um pelo outro,
porém escondido pelas amarras da amizade. Então aqui vai minha segunda
pergunta: Era necessário um carro quebrado, um par de pernas congelando e uma
fuga articulada de policiais para que duas pessoas descobrissem que amam uma a
outra? Se não fosse este episódio, os dois seguiriam seu caminho longe um do
outro? Eu diria que a expressão matemática que melhor se encaixa neste caso é a
soma. Tobin e Duke aprenderam nessa jornada a somar uma grande amizade, e a
descoberta de um amor adormecido resultando em uma parceria perfeita.
O terceiro e último conto (O Santo Padroeiro de Porcos) escrito por Lauren
Myracle, fala sobre Addie, uma adolescente deprimida pelo fim de seu
relacionamento com Jeb. O fato, é que durante o conto descobrimos que Addie é
uma menina egocêntrica, que mete os pés pelas mãos muitas vezes, mas está
disposta a mudar isso e quer mostrar essa mudança a todos que conhece. Tudo
começa quando Addie quer mudar o namorado e o acaba traindo com Charlie, porque
acha que seu protótipo de perfeição nunca vai existir. Quando sua ficha começa
a cair de que a perfeição não existe nem no outro e nem dentro dela, ela pede
para que Jeb a encontre em seu local de trabalho, porém o mesmo está dentro do
trem que estava indo a Flórida, e ele não consegue comunicação com sua amada
para explicar que está preso em um Waffle House devido a uma forte nevasca. O
que Addie logo entende é que seu ex-namorado não vai aparecer e muito menos a
perdoar pelos seus erros, e o drama todo parte daí. Suas melhores amigas a
consolam e a forçam a enxergar que seu egocentrismo têm que acabar, e então uma
delas lança um desafio à amiga: ela comprou um mini porquinho chamado Gabriel e
pede a Addie para busca-lo no primeiro horário em uma loja que fica a apenas um
quarteirão do seu local de trabalho. Claro que Addie não consegue cumprir sua
missão, mais uma vez por só pensar em si própria e nos seus problemas, quando o
acaso lhe coloca uma senhora em sua vida, que diz uma das melhores frases do
livro: “Não é o que o universo nos dá que importa. É o
que nós damos ao universo". Desta maneira Addie percebe todos os erros
cometidos até então e alcança a redenção e a compreensão de que o problema
externo na verdade estava o tempo todo habitando o seu interior. Minha terceira
e última pergunta: É na dor que aprendemos a nos enxergar verdadeiramente e
buscar a melhoria de nossos atos perante o coletivo? Neste caso eu diria que
Addie usou da divisão matemática para aprender que nem tudo gira em torno de si
própria, às vezes é necessário sair de dentro da caixa para conseguir enxergar
o outro.
Neste caso só faltou à multiplicação, então convido a você leitor, que
multiplique estas pequenas histórias para a sua vida e a dos outros que conhece,
até porque, não temos que esperar que só o acaso trabalhe ao nosso favor. Nós
também podemos enxergar em nós próprios nossas expressões matemáticas e somar,
subtrair, dividir e multiplicar nossos atos a nosso favor e da sociedade que
vivemos. Está esperando o que para achar o seu resultado perfeito?
Minha nota: 8,5