segunda-feira, 23 de janeiro de 2017

"Às vezes surge um cão que verdadeiramente toca a sua vida, e você jamais consegue esquecê-lo." - Resenha do livro "4 Vidas de um Cachorro" - Bruce Cameron

4 Vidas de um Cachorro conta a história de um cãozinho que busca o sentido de sua existência, ou melhor, de suas várias existências. 

Inicialmente nascido como um vira-lata, ele experimenta ao lado de uma mãe e dois irmãos, diversas aventuras e dificuldades de um cão de rua, que constantemente precisa lutar por alimento e fugir dos perigos conhecidos como humanos. Mas esta primeira experiência não é lá muito longa, e logo ele se vê como filhote novamente, com uma nova mãe e novos e muitos irmãos. 

Em sua segunda vida, nosso protagonista é um Golden Retriever, que acaba no lar do menino Ethan. Chamado de Bailey Bailey Bailey, o cãozinho tem nessa vida um dos seus maiores aprendizados: amor, companheirismo, proteção e fidelidade. 

Bailey literalmente cresce ao lado de Ethan, compartilhando com ele vários momentos importantes na vida de uma criança. A primeira briga de mão, o primeiro amor, o divorcio de seus pais e o dilema da escolha da faculdade. Depois de longos anos ao lado de seu melhor amigo, ou como Bailey gosta de chama-lo, "o seu menino", nosso super cão acaba morrendo bem velhinho, feliz por ter terminado sua jornada podendo vivenciar o mais puro sentimento de amor e carinho. 

Sem entender muito bem o porque, Bailey volta como um filhote de pastor alemão, desta vez para ser mais exata, como uma cachorra fêmea. Chamada de Ellie, nossa nova protagonista vai desempenhar um importante papel como cão de resgate na policia civil. Ellie é treinada desde filhote, e possui um faro extremamente aguçado, e ao lado de seu primeiro dono, o policial Jakob, e posteriormente a policial Maya, Ellie salva muitas vidas em diversas situações de perigo. 

O grande dilema que nosso cão enfrenta como Ellie é qual seria o propósito de sua vida canina em voltar tantas e repetidas vezes  como cães totalmente diferentes em circunstâncias totalmente diferentes? Claro que nosso amoroso e afetivo cão lembra de absolutamente cada detalhe de todas as suas vidas passadas, e sofre por não ter podido voltar como o fiel escudeiro de Ethan. Mesmo sentindo imensas saudades do seu menino, nosso cãozinho permanece fiel ao seu novo objetivo de vida, pois consegue enxergar em Ellie um sentido para viver, ele agora é um cão que salva vidas, e é extremamente grato por isso. 

Novamente Ellie morre, desta vez também bastante idosa, porém tendo desempenhado uma vida muito plena e satisfatória. Para sua surpresa, quando abre os olhos, nosso cão é novamente um filhote, desta vez vivendo em um canil que vende cachorros a preços bem exorbitantes. Acontece que desta vez, nosso cão parece deprimido e não enxerga o porquê retornou novamente a vida, vivendo prostrado em um canto, sem querer socializar nem com seus irmãos e nem com nenhum humano. 

Para despachar rapidamente o único cão que não foi vendido na ninhada, o dono do canil praticamente o dá de graça para um rapaz esquisito, que resolve presentar a namorada com um cachorro. Acontece que essa namorada não é lá uma pessoa muito organizada, e deixa nosso cão a ver navios, e acaba multada por ter trazido um cão de grande porte para morar em um pequeno apartamento no subúrbio. Sem poder fazer nada a não ser passar seus dias sentindo que sua vida não tem propósito nenhum, o cão que desta vez não tem nem nome, acaba nas mãos de uma família pior ainda que sua primeira e desleixada dona, que decide depois de muito maltrata-lo, abandona-lo em um matagal bem longe do cenário urbano. 

Para sua surpresa, ele acaba exatamente na fazendo onde o Avô e a Avó de Ethan moravam. Quais as chances de finalmente nosso cão entender o seu propósito de vida?

Posso adiantar que o encontro com Ethan acontece de uma maneira muito emocional, e desta vez nosso querido cão ganha pelo seu menino o nome de Amigão, e é nesta vida que ele finalmente entende o porque de ter retornado exatas quatro vezes, e a forma como aprendemos sobre propósito de vida com Bailey, Ellie ou Amigão é sutil, porém muito bonita e extremamente reflexiva. 

Ler 4 Vidas de um Cachorro é rir e chorar o tempo todo. A narrativa é toda feita do ponto de vista do cão. Para quem tem cachorro, por várias vezes já imaginou o que ele poderia estar pensando em determinados momentos chaves de nossa relação com eles. Acompanhar as descobertas  do filhote e suas boas intenções ao fazer o que os humanos interpretam como travessuras é muito divertido e rende ótimos momentos ao leitor. 

Tirando de lado todos os aspectos dramáticos que compõe esta linda história, este inocente porém muito esperto cãozinho nos ensina algo que poucos humanos ainda conseguiram compreender: o que é propósito de vida? Porque vivemos? 

Imagine um martelo. Ele foi desenhado para bater pregos, certo? Agora imagine que o martelo nunca é usado, fica simplesmente jogado e esquecido dentro da caixa de ferramentas. Pense que o martelo possui uma alma, uma consciência própria, e passam-se dias e mais dias e ele continua dentro da caixa de ferramentas sem algum propósito de existir. Ele se sente meio estranho, mas não sabe exatamente o porquê. Alguma coisa definitivamente está faltando para ele, mas o que seria?

Então um dia, alguém o retira de dentro da caixa e o usa para quebrar alguns galhos para pôr na lareira. O martelo fica cheio de alegria. Ser segurado, utilizado para algum fim é bastante satisfatório. No final do dia entanto ele se sente insatisfeito. Bater nos galhos foi divertido, mas não o bastante. 

No decorrer dos dias, ele foi utilizado frequentemente. Desamassou uma calota, despedaçou algumas pedras, colocou o pé de uma mesa no lugar. Mesmo assim, ele continua infeliz. Ele anseia por mais. Ele quer ser usado o máximo que puder para bater nas coisas ao seu redor, para quebrar, despedaçar e amassar. Ele descobre que ainda não experimentou o bastante desses eventos para se sentir completo.

Chega o dia em que alguém usa o martelo num prego. De repente, uma luz invade a alma do martelo. Ele agora consegue entender para que verdadeiramente foi projetado. Foi feito para bater pregos. Agora ele sabia o que sua alma de martelo estava buscando por tanto tempo.

Assim como o martelo ou o nosso cãozinho, todos temos um propósito na vida. E por mais que as vezes não conseguimos enxergar isto, existe um propósito para que tenhamos vindo a este planeta neste determinado momento da história. 

Engana-se quem entende que propósito precisa necessariamente ser algo grandioso e espetacular. Propósito é nada mais nada menos que cumprir com dignidade a trajetória que escolhemos realizar nessa nossa passagem pela Terra.  

Ocorre que muitas pessoas, apesarem de terem uma vida tranquila, sem grandes problemas de natureza material, sentem um vazio, como se lhes faltasse algo importante, que elas não conseguem definir o que seria.

De um modo geral, quando isso acontece, é porque elas não estão vivendo em consonância com os anseios de sua alma, e sim seguindo padrões estabelecidos pela sociedade. E porque não voltar várias e várias vezes até conseguirmos acertar o caminho certo? Tirando de lado as crenças religiosas, a vida nos dá diversas chances, concordam?

Para que possamos viver realmente em sintonia com o nosso propósito de vida, devemos antes descobrir do que precisamos para nos sentir verdadeiramente felizes. Que tipo de atividades realizamos, a espécie de relacionamentos que estabelecemos e a postura que temos diante da vida. Estes foram alguns parâmetros que Bailey no final de algumas tentativas indo e voltando a vida determinou para ter a sua resposta final. E é exatamente o que todos deveríamos fazer invés de procurar apenas pela felicidade.

A grande lição que fica ao final desta prazerosa leitura é que é preciso se renovar constantemente, possuir a determinação de viver uma vida plena  dentro daquilo que nos propusemos a realizar, pois assim o sentimento de vazio com certeza não existirá e será altamente substituído por uma sensação de equilíbrio, harmonia e paz interior.

Independente desta lição vir no formato de um cachorro, que nem sempre consegue ter um grau de compreensão tão grande como um ser humano, o bacana de refletir sobre a conclusão desta obra, é que por justamente não ser complexo como um ser humano, é que este fantástico cão usou apenas de um sentimento puro, o amor, para descobrir o seu propósito de vida.

Talvez o que afinal falta para nós humanos para chegar a conclusão que o Bailey chegou, é a falta de usar o sentimento mais nobre do mundo em nossas ações.

Bailey, Bailey, Bailey, você tocou tão profundamente a minha vida, que eu realmente não vou conseguir esquecê-lo.

Para homenagear estes seres absurdamente puros e quem tem muito a nos ensinar, deixo para vocês a foto da minha Bailey, aquela que através de suas travessuras, lambidas e amor incondicional, me ensina diariamente a buscar por aquilo que eu amo.


Minha nota: 10

segunda-feira, 9 de janeiro de 2017

"Tudo tem começo e meio. O fim só existe para quem não percebe o recomeço." - Resenha do livro "Uma Curva no Tempo" - Dani Atkins

"Algumas amizades resistem a qualquer distância, separação ou negligência."

É falando sobre amizade que começo a resenha do único livro escrito por Dani Atkins. Tudo se inicia quando nossa protagonista Rachel, está prestes a se separar dos seus amigos depois do fim do ensino médio. Ao todo, seus amigos formam um grande grupo que se conhece a muito tempo, e assim compartilham muitos momentos juntos. 

Rachel e Jimmy além de vizinhos, são melhores amigos desde pequenos, o que fez com que sempre se sentissem muito a vontade um com o outro. Além de Jimmy, Rachel namora Matt, que também faz parte do grupo de inseparáveis amigos, mas é em Sarah que Rachel têm sua melhor amiga. Cathy, a amiga do grupo que mais se parece uma modelo de passarela de tão linda, se junta a Phil e Trevor para fechar este grupo tão seleto de amigos. 

 Perto de se separarem para encarar a vida universitária, este grupo de amigos marcam de jantar juntos em um restaurante no centro da pequena cidade de Great Bishopsford. Em algum momento entre uma garrafa e outra de vinho, Jimmy convida Rachel para ir depois para a sua casa, dizendo que precisa conversar com ela e lhe contar algo muito importante. Todavia, no que seria supostamente a última noite em que todos estariam juntos, um grave acidente acontece. 

Rachel, que estava sentada na mesa em um lugar muito próximo a janela do restaurante, ouve Matt gritando que um carro a 100 km por hora estava vindo em direção a eles de forma descontrolada. O choque é tão grande que em meio a confusão de todos correndo para salvar suas vidas, Rachel se percebe presa entre as cadeiras que caíram no chão. Neste momento é Jimmy quem volta até a mesa para puxar Rachel e salva-la. Numa inversão de papeis, Rachel consegue se desvencilhar das cadeiras, enquanto Jimmy acaba sem vida, tornando este o começo de uma vida traumática para todos os presentes naquele jantar. 

Passam-se 5 anos e Rachel agora está com 23 anos de idade. Como consequência do fatídico dia do acidente, ela carrega uma grande cicatriz no rosto e dores de cabeça constantes. Sua vida em nada foi como esperado e sonhado em sua adolescência. A perda de seu melhor amigo Jimmy fez uma enorme cicatriz também em seu coração, e por sentir-se extremamente culpada, ela acabou terminando seu relacionamento com Matt na época do acidente, nunca mais voltou a sua cidade natal e também não cursou a faculdade de jornalismo que tanto queria. Seu pai está com câncer e Rachel mora e trabalha em Londres como secretária em um escritório de advocacia. 

A única razão que a leva a voltar a Great Bishopsford é o casamento de Sarah, e nesta visita à cidade, Rachel decide visitar o tumulo de Jimmy certa noite, sozinha. No cemitério ela começa a se sentir mal, sentindo as dores de cabeça de forma muito intensa. Sem sinal no celular para pedir ajuda a alguém, Rachel cai e apaga completamente. 

Quando ela acorda, está em um quarto de hospital com seu pai ao lado de sua cama. Ao abrir os olhos, Rachel percebe que seu pai está completamente bem. Quando nossa protagonista em completo desespero começa a questionar como que o pai se curou do câncer, o mesmo ri e diz que ele nunca ficou doente. Confusa com os acontecimentos derradeiros, a primeira pessoa a visitar Rachel no hospital é seu amigo Jimmy, que agora é um policial na cidade natal. Não chocante o suficiente, Rachel descobre que está noiva de Matt e leva uma vida extremamente bem sucedida como jornalista em uma renomada revista em Londres. Rachel, confusa e diagnosticada com amnésia, passa os capítulos restantes do livro tentando provar a todo custo que aquela vida apesar de maravilhosa, não é a sua verdadeira vida. 

Com Jimmy tentando acreditar na versão de sua melhor amiga, ambos iniciam uma grande aventura para alcançar a verdade, e aquele tão importante assunto que eles tinham a conversar depois do jantar de despedida, acontece, e o livro finaliza de uma maneira completamente inesperada, porém com a mensagem de que o tempo é mesmo o nosso melhor amigo, afinal de contas. 

Por ser o primeiro e único livro da autora, Uma Curva no Tempo tem um bom desfecho, um tanto quanto surpreendente e nada clichê, mas ao final esta obra nos deixa uma bela reflexão sobre escolhas, sobre como optamos por viver perante os acontecimentos da vida, e o que fazemos quando a mesma nos dá uma nova chance de mudar. 

Existe algo com que mais convivemos em nossas vidas do que escolhas mal feitas? Todos nós, desde cedo, aprendemos a conviver com os erros que cometemos e com as consequências que os mesmos nos trazem. É através deles que aprendemos a distinguir o que é certo e errado para nós, o que podemos ou devemos fazer. É através deste eterno aprendizado, entre erros e acertos, que moldamos principalmente o nosso caráter, que aprendemos a viver uma vida plena. 

Todo acerto nos eleva, como todo erro nos ensina. Independente de como, a verdade é que todos merecemos uma segunda chance. 

Não importa onde paramos. Em que momento da vida nos cansamos. O que importa é que sempre é possível e necessário recomeçar. Recomeçar é dar uma nova chance a si mesmo, é renovar as esperanças na vida, e o mais importante, acreditar em si próprio de novo. Sofrer é aprendizado. Chorar é limpeza de alma. Sentir raiva do outro é para que um dia possamos perdoa-lo e nos sentir leve novamente. Sentir-se só é quando fechamos todas as portas para as possibilidades. Acreditar que tudo esta perdido é uma chance de iniciar uma melhora para a nossa vida. A hora de iniciar é sempre agora, de encontrar prazer nas coisas simples.

O tempo pode nos trazer uma pequena curva em nossa história que nos faz pausar e ir mais alto, sonhar mais alto, querer o melhor independente de como a vida até então nos levou a viver. 

O protagonista desta história não é Rachel e seu grupo de amigos, mas sim o tempo, a curvatura que ele usou e usa sempre para nos dar uma única lição: Nós somos seres apaixonáveis, sempre capazes de amar muitas e muitas vezes. Afinal de contas, nós somos o amor. E quando temos amor, podemos sempre recomeçar. 

Que tal todos pararmos de olhar apenas a linha reta que está sendo a nossa vida até então, e nos permitir fazer uma curva para a direita ou para a esquerda, e enxergar de um outro angulo como podemos fazer novas escolhas?

O fim da estrada só existe para quem não percebe o recomeço constante dela. 

Minha nota: 8,5