quinta-feira, 16 de março de 2017

"Enquanto o ser humano der mais valor ao materialismo do que aos aspectos morais, o verdadeiro amor pouco há de existir." - Resenha do livro "O Som do Amor" - Jojo Moyes

Toda vez que começo a ler um livro da Jojo Moyes, me pego esperando uma narrativa emocionante e reflexiva. A autora sempre consegue através de seus personagens nos fazer pensar na nossa própria vida, e como nossas escolhas trazem consequências enormes e algumas lições muito valiosas. 

O Som do Amor nos faz refletir sobre união familiar, o valor de uma segunda chance, mas principalmente sobre materialismo e aquele tipo de ganância que corrói a alma. Invés de um romance arrebatador, encontramos nesta obra uma história de pessoas machucadas por um tipo de amor simbiótico e cruel, que mente, traí e subjuga. Eu diria que ao final deste livro, aprendemos um pouco mais sobre recomeços, que todos nós, maltratados ou não pela vida, merecemos. 

A história gira em torno da Casa Espanhola, uma construção antiga e maravilhosa situada no interior da Inglaterra, mas que por falta de cuidados está literalmente caindo aos pedaços. O velho proprietário da mansão, um senhor ranzinza e solitário, há anos recebe atenção e cuidados de sua jovem vizinha, Laura. Mesmo que para alguns, Laura e seu marido Matt pareçam caridosos e amorosos, no fundo o casal possui grandes planos para herdar a Casa Espanhola para si próprios. 

Todos os sonhos deste ambicioso casal acabam indo por água abaixo, quando chega à cidade, Isabel, uma jovem viúva e mãe de dois filhos, que acaba de herdar a Casa Espanhola após o falecimento repentino de seu antigo dono. 

Isabel se encontra em ruínas, e sem condições de manter o padrão de vida que sua família levava em Londres. Primeiro violino na Orquestra Sinfônica Municipal, Isabel tinha uma vida tranquila com seus dois filhos, Kitty e Thierry, mas tudo virou de cabeça para baixo quando seu marido Laurent morre em um acidente de carro, e deixa uma grande dívida para a sua família. Ao receber a notícia que herdou uma casa no interior, Isabel resolve colocar sua atual casa a venda, e se mudar com os filhos para a Casa Espanhola, que está em condições extremamente precárias, porém ela não sabe que Matt vai tentar a qualquer custo impedir que Isabel finque suas raízes na casa que ele acredita que lhe pertence. 

Ao longo do livro conhecemos muitas histórias e muitos personagens, todas eles sempre interligados pela Casa Espanhola, o verdadeiro objeto material responsável por todas as reviravoltas que nos deparamos capítulo a capítulo. Laura e Matt passam seus dias planejando projetos arquitetônicos e roteiros para grandes festas na Casa, porém possuem um casamento fracassado e vivem praticamente de aparências. Conhecemos também os típicos moradores simpáticos de uma cidade do interior, e como todos são afetados pela chegada de Isabel e seus filhos, além de nos aprofundarmos na história da própria jovem viúva e sua luta contra a depressão, seus filhos que carregam grandes traumas pela morte do pai, e personagens que ganham formas e nomes ao longo das páginas, todos almejando a Casa Espanhola por causa apenas de poder e dinheiro. 

Jojo Moyes consegue retratar o conceito de posse, mostrando ao leitor quanto um bem material pode corromper a alma humana. É incrível observar o que todos esses personagens estavam dispostos a fazer para possuir a Casa, e ao mesmo tempo é doloroso perceber o quanto a mente humana é suscetível ao erro por tão pouco. 

A grande protagonista desta história é Isabel. Acompanhamos sua insegurança e medo a cada página lida. Isabel é uma mulher que se encontra completamente perdida, não sabe fazer praticamente nada sozinha, pois passou a vida se dedicando apenas a música, e se vê em uma situação fatidicamente ruim, onde não tem controle nem sobre seus próprios filhos. Sozinha e desamparada em uma casa que está prestes a cair esfarelada no chão, Isabel tem que lidar com a falta de dinheiro, o desemprego, o fato de não conhecer seus filhos o quanto deveria, e milhões de responsabilidades. O ponto é que Isabel erra o tempo inteiro, se prioriza em muitos momentos, e literalmente foge da situação tocando seu violino para esquecer o que precisa ser alterado e realizado. Isabel nada mais é do que uma humana, repleta de erros e decisões mal tomadas, mas mesmo totalmente fragilizada e quebrada por dentro e por fora, nossa protagonista aos poucos vai descobrindo o real significado da vida, e passa a demonstrar pequenas forças dignas de algumas boas lágrimas. 

Quem somos nós para julgar Isabel e suas impensadas ações? Quantas vezes não fugimos de nossos problemas e colocamos todos eles como pó embaixo de um tapete, para depois resolver fazer uma faxina em nossas vidas?

É por causa da Casa Espanhola que Isabel amadurece, cria forças para superar o luto e passa aos poucos a conhecer os filhos de verdade, e principalmente a ouvir o próprio coração e entender seus sonhos aquém de sua música e seu violino. 

Claro que não vou entregar o final desta história e nem mencionar todos os personagens e como suas histórias se entrelaçam, o melhor do Som do Amor é ser surpreendido pelo seu desfecho digno, justo e bonito. 

Mas o que posso levar dessa obra é uma reflexão sobre valores. Durante nossa vida, aprendemos a valorizar coisas que não são fundamentais. Materialismo, poder, status e coisas deste tipo são o que infelizmente importam na nossa sociedade. O Som do Amor nos convida para uma verdadeira revolução de alma. 

É nesta revolução que eu pude tirar algumas boas lições: É preciso investir na alma, resgatar não só a natureza, mas o que é natural. Não filtrar as emoções, enriquecer a inveja, mas sim contabilizar as boas relações. Reciclar as relações ruins e preservar as boas e velhas amizades. Equipar o prazer, trabalhar com perseverança e vencer constantemente o cansaço da vida. Fazer a diferença sem precisar fazer propaganda disso. Resolver o que precisa ser resolvido sem alarde, usar o marketing da sinceridade e cobrar profissionalismo de todos. Maximizar energia, preservar recursos, renovar os estoques de sorrisos, canalizar sempre os bons pensamentos, abraçar e demostrar amor. Dizer não ao racismo, a intolerância, a discriminação, ser saudável fisicamente e mentalmente. Dar bons exemplos. Dizer sempre a verdade, principalmente para as crianças, para que elas cresçam sabendo o que é acreditar. E agradecer, sempre, por cada percalço, por cada conquista, por cada dia que vamos acordar e enfrentar a beleza que é viver. 

Casa Espanhola, você foi abrigo para muitas mudanças interiores dos personagens desta bela obra, afinal de contas a melhor reforma é a reforma da vida, aquela que temos constantemente a oportunidade de alterar, limpar e renovar.

Minha nota: 7,5