terça-feira, 7 de janeiro de 2014

"Já ouvi falar de pessoas que chegam atrasadas ao seu próprio enterro, mas tive a distinção incomum de chegar atrasada ao meu próprio nascimento." - Resenha do livro "Chá de Sumiço" - Marian Keyes

2014 começou e junto com ele muitos livros já lidos, e ideias de resenhas borbulhando na cabeça e loucas para serem transformadas em palavras.

Eis que ganho do bom velhinho o novo livro de Marian Keyes. Chá de Sumiço me pegou de surpresa, porque imaginei que a história seria uma e conforme fui virando suas páginas me deparei com um conflito que considero o pior de todas na existência humana, a falta do conhecimento próprio. A vida é uma tremenda confusão, e determinados acontecimentos importantes passam tão desapercebidos que o que era confuso no inicio se torna medo, angústia e uma falta completa de definição. "O que eu sou? O que eu gosto? O que eu quero?"

Vamos falar sobre o livro: Nossa protagonista é Helen, a única irmã pirada da família Walsh que faltava possuir sua própria história contada em um livro de Marian Keyes (para quem acompanha a autora, seus outros livros retratam a vida das irmãs de Helen - se você ainda não leu, não perca tempo, encontre aqui nesse blog as resenhas de todas as histórias dessa família graciosa e ao mesmo tempo, intrigante).

Helen não vive um bom momento em sua vida. Seu trabalho como detetive particular não vai nada bem, seu apartamento foi tomado por falta de pagamento e seu ex conturbado namorado surge com uma proposta de trabalho: encontrar o desaparecido músico de uma boy band do momento. Precisando do dinheiro, ela se vê forçada a aceitar, o que causa nela uma grande confusão - conviver com o ex e relembrar seu passado obscuro, e também administrar seu atual relacionamento com um homem muito sexy, porém com uma bagagem um tanto quanto pesada (3 filhos e uma ex mulher).

Helen é arrastada para um mundo complexo, perigoso e glamouroso do showbiz. A banda é a Laddz, e a mesma está desintegrada há anos, mas como todos os integrantes precisam de dinheiro, seu ex namorado (um produtor musical de tabela) resolve ressuscita-los e promover alguns shows especiais para arrecadar fundos. A trama começa quando um dos principais integrantes toma um chá de sumiço e desaparece. Porém, não é o sumiço do músico que movimenta a história, e sim a descoberta da nossa protagonista do quanto ela tem em comum com o desaparecido.

Helen se mostra uma pessoa destemida, alegre e como alguns gostam de nomear "porra louca". Porém, ficamos em choque quando é revelado que ela passou um período de sua vida doente e ainda sofre com a fase que assolou sua vida. Ela se depara com essa faceta, quando percebe que o integrante sumido têm o mesmo problema que ela, uma depressão extremamente profunda, que os faz pensar constantemente em suicídio (alias, em vários momentos do livro tentativas de acabar com a própria vida são retratadas por Helen). Fiquei surpresa em ler a respeito da depressão, pois pude perceber que mesmo a mais feliz das pessoas, aquelas que aparentemente não possuem nenhum tipo de problema, escondem algumas coisas em seu interior que acabam por lhe fazer muito mal, de maneira bastante avassaladora. O mais interessante é que ninguém ao redor desse tipo de pessoa percebe nenhuma mudança em sua personalidade, e nem mesmo a própria portadora da doença. Um assunto que acredito piamente que todos deveriam ler a respeito. Eu mesma já sofri deste grande mal e o que mais eu ouvia ao meu lado era "Você é tão alegre e animada, não pode sofrer de depressão"...pois é meus caros leitores, a vida é mesmo uma caixinha cheio de mistérios.

O mais bacana do livro é a sensibilidade que a autora usa para tratar de assuntos sérios em meio ao humor. Ela usa uma personagem alegre, feliz e cheia de si para expor uma doença gravíssima, fato este que leva o motivo do descobrimento de Helen de sua condição a desaparecer. A depressão pode fazer com que nada ao nosso redor faça sentido, nossa vontade é mesmo tomar um chá de sumiço, um fio de cabelo vira uma peruca, uma sujeira vira um armazém de esgoto e uma lágrima vira um riacho de lamentações.

Para ser bem simplória, a definição de depressão é uma doença que se caracteriza por mudanças no humor e pela perda de prazer em atividades cotidianas, que antes eram prazerosas ou motivadoras.

O gozado é que no livro, Helen demonstra todos esses sintomas, mas quando ela percebe que o objeto de suas investigações também sofre deste mesmo mal, ela vê uma motivação quase sufocante em encontra-lo e nesse ínterim se encontrar também. Nossa investigadora semi profissional só desvenda o mistério do desaparecimento do músico quando admite a si própria o que é, quando não chega atrasada ao seu próprio nascimento e finalmente vê no espelho o reflexo do seu verdadeiro eu. É com esse "clique" que Helen percebe tudo e dá um desfecho no chá de sumiço, e o substitui por uma boa dose de chá de auto conhecimento. Uma verdadeira lição de vida, eu diria, se ao menor dos infortúnios eu chamasse de "choque de realidade", uma das mais eficazes maneiras de se salvar da depressão. 

Não espere um desfecho sensacional para o misterioso sumiço do músico, pois Marian não é autora do gênero policial, mas espere por incríveis reviravoltas, descobertas fenomenais e o mais revelador dos mistérios: "Agora eu sei o que eu sou, o que eu quero e o que eu gosto". 

Com toda essa história de superação, espere um final feliz a Helen em relação a sua vida profissional e amorosa, mas esses dois aspectos são meros coadjuvantes para a verdadeira felicidade que é se auto conhecer e abrir todas as portas para a tão aclamada vontade de viver. 

Obrigada Marian Keyes, você me fez entender melhor quem eu sou, o que eu quero e o que eu gosto.  Eu vi em Helen meus maiores medos, e também vi em seu grau de superação minha maior alegria. 2014, seja bem vindo com muitos livros motivadores e verdadeiros professores da vida. 

Obs: essa resenha eu dedico a uma grande amiga irmã que me presenteou com este livro tão significativo. Adriana Ribeiro, obrigada por sempre me apoiar em minhas iniciativas e saber que o amor supera qualquer obstáculo. Essa daqui vai para você!

Minha nota: 9,0

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