sexta-feira, 26 de agosto de 2016

"Certa vez uma pessoa sábia me disse que escrever é perigoso pois nem sempre podemos garantir que nossas palavras serão lidas no espírito em que foram escritas..." Resenha do livro "A Última Carta de Amor" - Jojo Moyes

Palavras cantam. Eu as amo, tenho vontade de abraça-las, as persigo, as mordo, as derreto. Amo tanto as palavras, principalmente as inesperadas. As que se amontoam, se espreitam, até que de súbito caem. São tantos os vocábulos amados. Palavras brilham como pedras de cores, saltam como irisados peixes, são espuma, fio, metal e orvalho. Eu persigo algumas palavras, de tão belas quero coloca-las em poemas. Agarro-as em voo, quando andam soltas, e caço-as, as limpo, as descasco, preparando -as diante do prato. Sinto-as cristalinas, vibrantes, ebúrneas, vegetais, oleosas, como frutas, como algas, como ágatas, como azeitonas. E então eu as agito, bebo, trago, trituro e as liberto. Deixo-as como estalactites em poemas, como pedacinhos de madeira polida, como carvão, como restos de naufrágio, presentes nas ondas e no mar. Tudo está na palavra. Um ideia inteira altera-se porque uma palavra mudou de lugar, ou porque outra se sentou como um rei dentro de uma frase que não a esperava, mas que lhe obedeceu. Elas têm sombra, transparência, peso, penas, pelos, têm de tudo quando se lhes foi agregando de tanto rolar pelo rio, de tanto transmigrar de pátria, de tanto serem apenas raízes. São ao mesmo tempo antigas e recentes. Vivem no escondido e na flor que despontam. Desaparecem, mas não adormecem. Renascem  para trazer a tona seu real e precioso significado. 

E foram justamente as palavras as responsáveis por este belíssimo romance de Jojo Moyes. 

O livro começa no belo cenário de Londres nos anos 1960. Ao acordar em um hospital após um acidente de carro, Jennifer Stirling não consegue se lembrar de absolutamente nada. Novamente em casa, com o marido, ela tenta sem sucesso recuperar a memória de sua antiga vida. Por mais que todos a sua volta pareçam atenciosos e amáveis, Jennifer sente que alguma coisa está errada. É então que ela descobre uma série de cartas de amor escondidas, endereçadas a ela e assinadas apenas por "B". Nossa protagonista percebe que não só tinha um romance fora do casamento, como também parecia disposta a arriscar tudo para ficar com o seu amante. 

Enquanto acompanhamos toda a história de Jennifer antes de seu acidente de carro, somos convidados a fazer uma viagem para quatro décadas depois, e nos anos 2000 conhecemos a jornalista Ellie Haworth, nossa outra protagonista desta intrigante história. Ellie encontra uma dessas cartas endereçadas a Jennifer durante uma pesquisa nos arquivos do jornal em que trabalha. Coincidência ou não, pois ela também vive um romance complicado com um homem casado, Ellie fica obcecada pelo amor proibido de Jennifer e "B", e começa uma insana e investigativa procura por quem são estas pessoas, e o que de fato aconteceu com elas, para que este romance não tenha tido um final feliz. 

Com personagens realísticos, complexos e uma trama bem elaborada, A Última Carta de Amor entrelaça as histórias de paixão, adultério e perdas de Ellie e Jennifer. Falar mais sobre este livro é entregar todas as surpresas do desenrolar de uma obra comovente e irremediavelmente romântica. Desta forma, vou falar sobre o que A Última Carta de Amor significou para mim. Ao terminar o livro com um pingo de lágrimas nos olhos, e uma boa reflexão sobre o sentido de nossas atitudes, afinal toda ação possui uma reação, e no caso de nossas duas protagonistas não seria diferente, a não ser por dois excelentes artifícios chamados tempo e destino. 

A vida é feita de surpresas, e nossa simples missão dentro deste contexto é viver. Alguns momentos podem durar tão pouco e ficar na nossa memória por muito tempo. Algumas pessoas podem fazer muito pouco parte de nossas vidas, e ser considerada para sempre dentro de nossos corações. 

De uma coisa podemos ter certeza, de nada adianta querer apressar as coisas, pois tudo vem ao seu tempo, dentro do prazo que lhe foi previsto, mas o fato é que a natureza humana não é muito paciente. Temos pressa em tudo, e então acontecem os atropelos do destino, aquela situação em que você mesmo provoca por pura ansiedade de não aguardar o tempo certo. 

Quando alguma coisa coisa está para acontecer, ou chegar até sua vida, pequenas manifestações do cotidiano enviarão sinais indicando o caminho certo, que vem através da palavra de um amigo ou conhecido, de um texto ou de uma observação, mas com certeza o sincronismo se encarregará de colocar as coisas certas em seus devidos lugares, na hora certa e no momento certo. Afinal, nada acontece por acaso, certo? 

Por vezes o destino é como uma pequena tempestade de areia que não para de mudar de direção. Você pode mudar o rumo, mas a tempestade de areia vai sempre atrás de você. Você pode voltar a mudar de direção, mas a tempestade a persegue e te segue no teu encalço. Isto acontece uma vez e outra e outra, como uma espécie de dança maldita com a morte ao amanhecer. Porquê? Porque esta tempestade não é uma coisa que tenha surgido do nada, sem nada a ver com você. Esta tempestade é você. Algo que está dentro de você e precisa ser resolvido. Por isso, apenas te resta se deixar levar, mergulhar na tempestade, fechar os olhos e tapar os ouvidos para não deixar entrar a areia, e passo a passo, atravessa-la de uma ponta a outra. Aqui não há lugar para o sol e nem para a lua, a orientação e a noção de tempo são coisas que não fazem sentido. Existe apenas areia branca e fina, como ossos pulverizados, a rodopiar em direção ao céu. 

Não há maneira de escapar da violência da tempestade, a essa tempestade metafisica simbólica. Não se iluda caro leitor, por mais metafisica e simbólica que seja, o destino é real, porque você fez uma escolha. E quando a tempestade tiver passado, você mal se lembrará de ter conseguido atravessa la, de ter conseguido sobreviver. Nem sequer terá a certeza de a tormenta ter realmente chegado ao fim. Mas uma coisa é certa, quando a tempestade chegar ao fim, você já não será mais a mesma pessoa. Somente desta forma, é que o destino fará sentido quando ele contemplar sua tenra tarefa de te ensinar uma preciosa lição. E então quem sabe, em um dia chuvoso, depois que a tempestade maior passar, dois amantes depois de 40 anos de distância, terão a oportunidade de renovar suas escolhas, porque já que a vida é feita de surpresas, basta a nós vive-la da melhor forma possível. 

Imagino o dia em que todas as pessoas terão o direito de ser feliz, mesmo que seja só por um momento, para ter a oportunidade de sentir o que realmente desejam e acreditam, afinal os sonhos não deveriam ser meras bobagens. 

Jennifer e Ellie, obrigada por me fazerem enxergar que sonhar nunca foi um erro. Somos mesmo crianças aprendendo constantemente a viver. 

Espero que minhas palavras cheguem até vocês no espírito que as mesmas foram escritas, pois para mim esta não é uma última e única mensagem de amor, mas sim o inicio de um belo aprendizado que eu espero que seja passado a todos que simplesmente amam sonhar. 

Minha nota: 10

Obs: Ao longo de cada inicio de capitulo, Jojo Moyes reuniu últimas cartas, últimos emails e últimas mensagens de amor de diversas pessoas em diversos seculos de vida. Pessoais reais, que aceitaram ter suas histórias de amor divididas conosco. Felizes ou não, suas histórias sempre acabam por nos passar uma única mensagem: Vale sempre a pena. 

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